domingo, 10 de dezembro de 2017

Folclore e Patrimônio

Em sua origem, a ideia de Patrimônio (patrimonium) está relacionada à herança paterna, ou tudo que pertencia ao pai, do latim, pater, ou pater familias. Na sociedade romana, a noção de família era mais ampla que na nossa, compreendendo tudo que estava sobre domínio do senhor, incluindo aí a mulher, os filhos, os escravos e os bens, móveis (terra, casa, etc.) ou imóveis (ferramentas, animais, etc.). Tudo isso era o patrimonium, ou seja, o que pertencia ao pater. Portanto, podemos dizer que: “O conceito de patrimônio, surgido no âmbito privado do direito de propriedade, estava intimamente ligado aos pontos de vista e interesses aristocráticos.” (FUNARI; PELEGRINI, 2009: 11).
 Com o tempo, esse significado se dilatou e passou a designar algo que tenha importância não somente para um indivíduo, mas também para uma comunidade, uma região, um país, uma nação, ou mesmo para toda a humanidade. Temos ao menos duas divisões claras designadas pelo conceito de patrimônio: material e imaterial. Segundo Pedro Paulo Funari e Sandra Pelegrini:
Hoje, quando falamos em patrimônio, duas ideias diferentes, mas relacionadas, vêm à nossa mente. Em primeiro lugar, pensamos nos bens que transmitimos aos nossos herdeiros – e que podem ser materiais, como uma casa ou uma joia, com valor monetário determinado pelo mercado. Legamos também, bens materiais de pouco valo comercial, mas de grande significado emocional, como uma foto, um livro autografado ou uma imagem religiosa do nosso altar doméstico. Tudo isso pode ser mencionado em um testamento e constitui o patrimônio de um indivíduo.
A esse sentido legal do termo, devemos acrescentar outro, não menos importante o patrimônio espiritual. Quando pensamos no que recebemos de nossos antepassados lembramo-nos não apenas dos bens materiais, mas também da infinidade de ensinamentos e lições de vida que eles nos deixaram. A maneira de fazer nhoques – que não se resume à receita, guardada com cuidado no caderno com a letra de nossa querida mãe ou avó –, o modo como sambamos (algo que nunca estará em um caderninho!), os ditados e provérbios que sabemos de cor e que nos guiam por toda a vida são exemplos de um patrimônio imaterial inestimável.” (FUNARI; PELEGRINI, op. cit.: 08-09).
 Embora o patrimônio material tenha reconhecimento há bastante tempo, só bem recentemente o patrimônio imaterial passou a contar com maior preocupação quanto à necessidade de sua proteção. Todavia, em 04 de agosto de 2000 foi promulgado o Decreto 3.551, que “Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro e cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial”.
O nosso folclore se encaixa nesta última questão, pois constitui também nosso patrimônio imaterial, sendo representado pelas tradições e manifestações populares, incluindo costumes, crenças, ritos, danças, mitos e lendas, que são passadas através das gerações. Em seu Dicionário do Folclore Brasileiro, Luís da Câmara Cascudo dá a seguinte definição para o folclore:
Folclore. É a cultura do popular, tornada normativa pela tradição. Compreende técnicas e processos utilitários que se valorizam numa ampliação emocional, além do ângulo do funcionamento racional. A mentalidade, móbil e plástica, torna tradicional os dados recentes, integrando-os na mecânica assimiladora do fato coletivo, como a imóvel enseada dá a ilusão da permanência estática, embora renovada na dinâmica das águas vivas. O folclore inclui nos objetos e fórmulas populares uma quarta dimensão, sensível ao seu ambiente. Não apenas conserva, depende e mantém os padrões imperturbáveis do entendimento e ação, mas remodela, refaz ou abandona elementos que se esvaziaram de motivos ou finalidades indispensáveis a determinadas seqüências [sic] ou presença grupal.” (CASCUDO, 1998: 400). 

            Esse folclore é, como percebemos, representação da legítima tradição popular, e, por isso, indispensável na formação de uma identidade nacional brasileira.



Referências bibliográficas:

CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Ediouro, 1998.

FUNARI, Pedro Paulo Abreu; PELEGRINI, Sandra de Cássia Araújo. Patrimônio Histórico e Cultural. 2ª ed.. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009.

Mário de Andrade – Missão de Pesquisas Folclóricas. Disponível em: <http://ww2.sescsp.org.br/sesc/hotsites/missao/> Acesso em: 23 abr. 2015.

VILHENA, Luís Rodolfo. Projeto e Missão: O movimento folclórico brasileiro (1947-1964). Rio de Janeiro: Funarte/Fundação Getúlio Vargas, 1997.




Este texto é parte do artigo "Movimento Folclórico Brasileiro e a formação de uma identidade musical brasileira", apresentado no 1° Encontro de Pós-Graduandos em História e Patrimônio da UFRRJ. Link do evento: https://www.facebook.com/encontrohistoriaepatrimonio

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