Mais uma vez se aproxima o Festival RTP da Canção em Portugal, que neste ano será no Pavilhão Multiusos de Guimarães (nos dias 18 e 25 de fevereiro, com a final no dia 04 de março de 2018), excepcionalmente, devido ao país ter pela primeira vez vencido o Festival Eurovisão da Canção, em 2017, o que lhe atribui o direito de sediar também o festival europeu, que terá sua 63ª edição nos dias 08, 10 e 12 de maio de 2018, em Lisboa, onde geralmente se realiza o festival português. Por isso, vamos deixar abaixo um resumo dos Festivais RTP para que possamos conhecer um pouco mais sobre este evento:
Surgido em 1964 com a finalidade de escolher uma
canção para representar Portugal no Festival Eurovisão[1], o
Festival RTP da Canção completa em 2014 cinquenta anos. Em toda a sua
existência, o festival português passou por diversas fases, nunca, no entanto, Portugal
chegou a vencer o Eurovisão, tendo como melhor colocação de sempre um sexto lugar com o tema “O
meu Coração não tem Cor” (Pedro Osório/ José Fanha), interpretado por Lúcia
Moniz, em 1996. O Festival RTP da Canção, no decorrer de sua história, tem animado
a produção nacional e serve de plataforma para novos talentos, novas canções e,
com isso, de novos autores. Como nos explica Vasco Hogan Teves:
O objectivo de chegada ao palco europeu da canção, anualmente proporcionado pela RTP, constitui razão de ser do seu próprio Festival. A principal, claro que sim, mas não a única, já que está aí a grande festa da música de que não é possível prescindir. Por outro lado, o ‘Festival RTP da Canção’ tem revelado dezenas de intérpretes, enquanto outros, não poucos, lhe devem a consagração junto do público. Mas os autores – sempre se diz, mas quase sempre se esquece, que o Festival não é de intérprete mas sim de autores – esses, principalmente, têm encontrado no certame anual da RTP um dos raros motivos que existem entre nós para produzirem e apresentarem publicamente os seus trabalhos. (TEVES, 2007, n.p.) [2]
O objectivo de chegada ao palco europeu da canção, anualmente proporcionado pela RTP, constitui razão de ser do seu próprio Festival. A principal, claro que sim, mas não a única, já que está aí a grande festa da música de que não é possível prescindir. Por outro lado, o ‘Festival RTP da Canção’ tem revelado dezenas de intérpretes, enquanto outros, não poucos, lhe devem a consagração junto do público. Mas os autores – sempre se diz, mas quase sempre se esquece, que o Festival não é de intérprete mas sim de autores – esses, principalmente, têm encontrado no certame anual da RTP um dos raros motivos que existem entre nós para produzirem e apresentarem publicamente os seus trabalhos. (TEVES, 2007, n.p.) [2]
É notável a contribuição que fizeram
os Festivais RTP da Canção para a música portuguesa em seus vários aspectos.
Segundo a Enciclopédia da Música em
Portugal no século XX, organizada por Salwa Castelo-Branco: “Durante as
últimas quatro décadas do séc. XX [o Festival RTP da Canção] contribuiu
decisivamente para a produção de repertório inédito, concretamente de canções,
para a emergência de novos estilos e para a mediatização de intérpretes no
âmbito da música ligeira ou da música popular.” (CÉSAR; TILLY; CIDRA, 2010, p.
501).
Notamos, portanto, que o Festival RTP
da Canção é importante não só para os intérpretes, devido à exposição que
encontram nesse festival de repercussão internacional (embora o Festival RTP nunca tenha contribuído de fato
para a projeção de artistas portugueses além fronteiras), mas
principalmente para os autores, responsáveis pela criação das canções e que a
cada dia se renovam e renovam o festival. E não só isso, o festival movimenta
todo um aparato para sua realização que envolve produtores, equipes técnicas,
imprensa e tudo que é necessário para sua produção e difusão.
Ademais, o Festival RTP da Canção se
volta para a expressão da alma portuguesa, na medida que a canção vencedora tem
a incumbência de representar Portugal no Festival Eurovisão, concorrendo com
diversas outras nacionalidades. A partir desse momento, procura-se integrar às
canções os elementos constituintes que identificam o povo português, seu gosto
musical, seus símbolos nacionais, e tudo aquilo que de alguma forma caracterize
uma identidade nacional portuguesa, encontradas em referências aos feitos do
passado (como às glórias do período da Expansão Marítima Portuguesa), aos mitos
(à exemplo da lenda de Brites de Almeida, a padeira da Batalha de Aljubarrota),
ao mar, ao pinho, ao milho, ao trigo, ao alecrim, ao cravo vermelho[3],
ao fado e ainda a expressões do folclore português, como o malhão, o vira ou os
caretos de Trás-os-Montes. Em outras palavras, as canções que concorrem no
festival português, procuram falar por seu país.
O Festival RTP da Canção, cuja história
não se dissocia da Rádio e Televisão de Portugal (RTP), teve sua primeira
edição em 1964, e, com raríssimas exceções, foi realizado todos os anos até os
dias de hoje, algumas vezes, no entanto, sem o intuito de concorrer no Festival
Eurovisão, mas apenas para consumo interno. Noutras, optou-se pela não
realização do certame. Passaremos agora a conhecer um pouco mais sobre esse festival,
que chega agora ao seu cinquentenário.
Breve histórico do Festival RTP da Canção.
Em 1964, ainda sob o nome de Grande
Prémio TV da Canção Portuguesa (denominação que duraria até 1975), realiza-se o
primeiro festival para selecionar uma canção portuguesa para o IX Festival
Eurovisão da Canção, a ser realizado em Copenhagen, Dinamarca. A canção
vencedora foi “Oração” (Francisco Nicholson/ Rogério Bracinha/ João Nobre),
interpretada por António Calvário. No Eurovisão, a canção obteria indesejados nul points. Era o início do calvário
eurovisivo português.
No ano seguinte, outra representante
do nacional-cançonetismo, “Sol de Inverno” (Nóbrega e Sousa/ Jerónimo
Bragança), interpretada por Simone de Oliveira. Talvez devido ao seu
magnetismo, Simone viria a alcançar 1 ponto naquele Eurovisão de Nápoles,
Itália, conquistando a 13ª posição.
Em 1966, o ié-ié “Ele e Ela” (Carlos
Canelhas), interpretado por Madalena Iglésias, que mostrou-se muito mais extrovertida,
repetiu a 13ª posição alcançada no ano anterior.
Outro ié-ié venceu o certame de 1967,
“O Vento Mudou” (Nuno Nazareth Fernandes/ João Magalhães Pereira), interpretado
por Eduardo Nascimento, cantor de origem angolana que se tornou o primeiro
negro a representar Portugal no Eurovisão, uma forma que o regime salazarista
encontrou para se mostrar incluso em uma política de integração racial. Ficou
em 12º entre os 17 concorrentes.
Já em 1968, foi a vez do rock “Verão” (Pedro Correia Vaz Osório/
José Alberto Magro Diogo), interpretado por Carlos Mendes. No entanto, a canção
causou grande furor e acabou não agradando a alguns, sendo duramente criticada[4]. Ficou
na 11º colocação entre os 17 países que concorreram.
No ano de 1969, sagrou-se vencedora a
canção “Desfolhada” (Nuno Nazareth Fernandes/ José Carlos Ary dos Santos),
interpretada por Simone de Oliveira, canção com muito de portuguesa e de grande
impacto, alinhada ao “canto
de intervenção”[5].
Mesmo com toda expectativa criada em torno da canção, Portugal ficaria apenas
com o 15º lugar entre os 16 países candidatos, o que foi considerado uma grande
injustiça e levou Portugal a decidir não participar do certame europeu no ano
seguinte.
Mesmo se afastando do eurofestival,
em 1970, a RTP realiza um festival apenas para consumo interno em que saiu
vencedora a canção “Onde vais Rio que Eu Canto” (Carlos Nobrega e Sousa/
Joaquim Pedro Gonçalves), com interpretação de Sérgio Borges.
Visando retornar ao Eurovisão, a RTP realiza
em 1971 mais um certame onde venceu a canção “Menina do Alto da Serra” (Nuno
Nazareth Fernandes/ José Carlos Ary dos Santos), interpretada por Tonicha. A
canção garantiu o 9º lugar em Dublin, Irlanda, melhor colocação de Portugal até
então.
Entusiasmada com o resultado do ano
anterior, a RTP realiza em 1972 um novo festival, este somente com intérpretes
masculinos, vencendo a canção “A Festa da Vida” (José Calvário/ José Niza),
interpretada por Carlos Mendes, outra canção alinhada ao “canto de
intervenção”, repleta de metáforas contra o regime marcelista, alcançando o 7º
lugar e melhorando a posição de Portugal no Eurovisão.
No ano seguinte, vence mais uma
canção representante do “canto de intervenção”, “Tourada” (Fernando Tordo/ José
Carlos Ary dos Santos), que chegou a receber um veto, mas que depois foi
retirado. No festival europeu Fernando Tordo deixou Portugal em 10º lugar entre
os 17 concorrentes.
A RTP manteve os ânimos e em 1974, às
vésperas do fim da ditadura no país, realizou um novo festival no qual venceu a
canção “E Depois do Adeus” (José Calvário/ José Niza), interpretada por Paulo
de Carvalho. A canção foi usada como uma das senhas para a Revolução de 25 de
Abril, tornando-se uma das mais conhecidas canções portuguesas[6]. Entretanto,
a canção ficou entre os últimos colocados no Eurovisão de Brighton, no Reino Unido, ex aequo Noruega, Suíça e Alemanha.
Com o fim da ditadura no país, as
canções tonaram-se mais diretas, a exemplo da vencedora de 1975, “Madrugada”
(José Luís Tinoco), interpretada por Duarte Mendes (um dos capitães do 25 de
Abril), canção cujo teor revolucionário também pode ter pesado na decisão dos
jurados. Entretanto, no Eurovisão de Estocolmo, Suécia, a canção obteve apenas
o 16º lugar entre 19 concorrentes.
Em 1976, com Portugal ainda se
reestruturando sob o novo regime democrático, o festival ganha outro nome, “Uma
Canção para Europa”. Todas as oito canções concorrentes foram interpretadas por
Carlos do Carmo (renomado fadista), sagrando-se vencedora a canção “Uma Flor de
Verde Pinho” (José Niza/ Manuel Alegre). Foi por muitos considerado o melhor
festival de sempre promovido pela RTP. Entretanto, no Eurovisão Carlos do Carmo
alcançou apenas o 12º lugar.
No ano seguinte, insatisfeita com os
resultados anteriores, a RTP realiza o festival sob o nome de “As Sete
Canções”, mudando o sistema de seleção, agora seriam apresentadas sete canções
em duas versões cada uma. Saiu campeã a versão A da canção “Portugal no Coração”
(Fernando Tordo/ José Carlos Ary dos Santos), interpretada por Os Amigos, mas
que no Eurovisão só obteve o 14º lugar.
Já em 1978, o festival foi realizado
sob o nome de “Uma Canção Portuguesa”. Foi a vez da afirmação do novo pop português e do playback instrumental. Venceu a canção “Dai li Dou” (Victor Mamede/
Carlos Quintas), interpretada pelo grupo Gemini, uma canção dançante, mas que
no Eurovisão chegou somente ao 17º lugar entre os 20 países candidatos.
No ano de 1979, o festival recebe seu
nome definitivo, Festival RTP da Canção, ocorre uma volta da orquestra e há
também mudanças na forma de seleção, sendo realizado em três semifinais. Saiu
vencedora a canção “Sobe, Sobe, Balão Sobe” (Carlos Nóbrega e Sousa),
interpretada por Manuela Bravo, ajudando Portugal a conquistar o 9º lugar no
Eurovisão de Jerusalém, em Israel. Foi um período áureo, pois boa parte da
população parava em frente ao ecrã para assistir ao festival.
No ano seguinte, ocorre a primeira
transmissão televisiva regular em cores de Portugal, escolhendo justamente o
Festival RTP da Canção para sua primeira transmissão. A campeã desse ano foi a
canção “Um Grande, Grande Amor” (José Cid), interpretada pelo próprio autor.
“Foi a primeira vez que a canção portuguesa incluiu palavras de outras línguas
(inglês, francês, italiano e alemão) em sua letra.” (NEVES, 2011, p. 104), fato
que pode ter auxiliado na conquista do 7º lugar no Eurovisão.
Em 1981, mesmo com o sucesso do ano
anterior, o festival volta ao formato antigo e é realizado em um único dia. Saiu
vencedora a canção “Playback” (Carlos Paião), interpretada por Carlos Paião. No
Eurovisão daquele ano Portugal ficou com a penúltima posição, entre os 20
concorrentes.
No XIX Festival RTP da Canção,
realizado em 1982, saiu campeã a canção “Bem Bom” (António Pinho, Pedro Brito,
Tozé Brito), interpretada pelo grupo Doce, que pode ser considerada uma das
primeiras girls bands do mundo, mas
que no Eurovisão ficou apenas com o 13º lugar.
Em 1983, o festival realiza-se no
Coliseu do Porto, o primeiro a ser realizado fora de Lisboa. Escrita e interpretada
por Armando Gama, sagrou-se vencedora a canção “Esta Balada que te Dou”, que
ficou também com o 13º lugar, no Eurovisão de Munique, Alemanha.
Outra balada a representar Portugal
no festival europeu foi “Silêncio e Tanta Gente” (Maria Guinot) (hoje um
clássico da música portuguesa), interpretada pela autora, que se apresentou no
Eurovisão somente ao piano e acompanhada de uma corista, alcançando o 14º lugar.
Já
em 1985, venceu a canção “Penso em Ti (Eu Sei)” (Tozé Brito/ Luis Fernando/
Adelaide Ferreira), interpretada por Adelaide Ferreira, que mesmo apesar da
excelente participação (Adelaide chegou a terminar a apresentação de joelhos) e
de todas as expectativas, ficou com o penúltimo lugar entre os 19 países
concorrentes naquele Eurovisão de Gotemburgo, na Suécia.
Pondo
fim ao ciclo das baladas, em 1986 a vencedora foi uma canção
bem dançante, em sintonia com o pop
britânico em voga no período, “Não Sejas Mau p’ra Mim” (Guilherme Ines/ Zé da
Ponte/ e Luis Oliveira), interpretada por Dora, que atingiu o 14º lugar no
Eurovisão de Bergen.
O festival de 1987 foi realizado no Cassino
Park Funchal. Para diminuir os gastos, a RTP restringiu o festival a seis
canções, saindo campeã “Neste Barco à Vela” (João Mendes/ Alfredo Azinheira),
interpretada pelo duo Nevada, alcançando o 18º lugar no Eurovisão daquele ano.
Em 1988, realiza-se a “I Selecção
Interna para o Eurofestival”, contando com uma pré-seleção com o nome de
“Prémio Nacional de Música”, realizada no Cassino da Figueira da Foz. A grande
vencedora foi a canção “Déjà Vu” (Zé da Ponte/ Guilherme Inês/ Luís Oliveira),
interpretada por Dora, que ficou apenas com o 18º lugar no Eurovisão, realizado
novamente em Dublin.
Voltando a uma seleção regular, em
1989, sagrou-se vencedora a canção “Conquistador”
(Ricardo/ Pedro Luís), interpretada pela banda Da Vinci, uma canção que
reportava ao período dos Descobrimentos e das grandes navegações. Entretanto, no
Eurovisão daquele ano, realizado em Lausanne, Suíça, os Da Vinci conquistaram
apenas o 16º lugar, entre os 22 países que concorreram.
No ano seguinte, saiu campeã a canção
“Sempre (Há Sempre Alguém)” (Luis Felipe/ Jan Van Dijck/ Francisco Teotónio
Pereira/ Frederico Teotónio Pereira), interpretada por Nucha, que representou
Portugal no Eurovisão de Zagreb, (Croácia) ex-Iuguslávia, mas só alcançou o 20º
lugar.
Em 1991, venceu a canção “Lusitana
Paixão” (Fred Micael/ Zé da Ponte/ Jorge Quintela), interpretada por Dulce
Pontes, canção que falava sobre o fado e que foi interpretada de forma ímpar no
Eurovisão de Roma, Itália, garantindo para Portugal o 8º lugar, o melhor
resultado desde 1980.
Devido ao sucesso alcançado no ano
anterior, a RTP realizou em 1992 um festival com cinco semifinais. A vencedora foi
a canção “Amor d’Água Fresca” (Dina/ Rosa Lobato de Faria), interpretada por
Dina, que representou Portugal no Eurovisão de Malmö, alcançando o 17º lugar.
O formato com cinco semifinais foi
repetido em 1993, sagrando-se vencedora a canção “A Cidade (Até ser Dia)”
(Pedro Abrantes/ Marco Quelhas/ Paulo da Costa), interpretada por Anabela,
então com apenas 16 anos, mas já com alguma experiência em grandes festivais. No
Eurovisão de Millstreet, na Irlanda, Anabela alcançou o 10º lugar entre os 25
concorrentes.
Em 1994, a vencedora foi a canção “Chamar
a Música” (João Carlos Mota Oliveira/ Rosa Lobato de Faria), interpretada por
Sara Tavares, jovem de ascendência cabo-verdiana, que contava também com apenas
16 anos. A canção arrebatou todos os prêmios que estavam a concurso
(intérprete, letra, orquestração) e recebeu o máximo de pontos de todos os 22
distritos que compunham o júri nacional. Em Dublin, Sara Tavares, que se tornou
a primeira negra (e até hoje a única) a representar Portugal no Eurovisão, teve
chances inclusive de vencer o festival, mas terminou com o 8º lugar.
A RTP, entusiasmada com os sucessos
consecutivos nos dois anos anteriores, realizou em 1995 um novo festival em que saiu vencedora a canção “Baunilha
e Chocolate” (António Vitorino de Almeida/ Rosa Lobato de Fria), interpretada
por Tó Cruz (assim como Sara Tavares, de ascendência cabo-verdiana). A canção
falava sobre questões como a mestiçagem e a aceitação racial. Entretanto, no Eurovisão daquele
ano, Portugal alcançou apenas o 21º lugar entre os 23 candidatos.
No ano seguinte, sagrou-se vencedora a
canção “O meu Coração não tem Cor” (Pedro Osório/ José Fanha), interpretada por
Lúcia Moniz. Segundo a imprensa, “O tom ‘corridinho’ e ‘saltadinho’ de raiz
popular portuguesa, assim como o tropical sabor ‘de figo de papaia e guaraná’
terá convencido o júri.” (Público, nº
2190, 09 mar. 1996: 28[7]).
Com esta canção, Portugal alcançaria sua melhor colocação de sempre no
Eurovisão, o 6º lugar entre os 23 países que concorreram em Oslo, na Noruega.
Em detrimento do enorme sucesso em
1996, segue-se uma derrocada. A canção vencedora do festival português de 1997,
“Antes do Adeus” (Thilo Krasmann/ Rosa Lobato de Faria), interpretada por Célia
Lawson, terminou o Eurovisão dividindo o último lugar com a Noruega, com nul points.
No ano seguinte, com a canção “Se Eu
Te Pudesse Abraçar” (José Cid), interpretada pelo grupo Alma Lusa, Portugal
voltaria a alcançar uma melhor colocação, o 12º lugar entre os 25 concorrentes.
Em 1999, saiu vencedora a canção “Como
Tudo Começou” (Jorge do Carmo/ Tó Andrade), interpretada por Rui Bandeira, que
naquele Eurovisão de Jerusalém, ficou apenas com o 21º lugar.
No ano de 2000, devido ao aumento de
países querendo participar do Eurovisão, a UER decidiu que os países com baixa
pontuação nos últimos três anos ficariam de fora, Portugal, então, não
participou. Mas, ainda assim, a RTP realizou um festival nacional, onde saiu
vencedora a canção “Sonhos Mágicos” (Maria da Conceição Norte/ Gerardo
Rodrigues), interpretada por Liana.
Portugal, por não ter participado no
ano anterior, ganhou o direito de ter um representante no Eurovisão de 2001. Nesse ano venceu a canção “Só Sei ser Feliz Assim” (Marco
Quelhas), interpretada pelo duo MTM, que no Eurovisão alcançaram o 17º lugar. Os
integrantes do MTM (sigla com as iniciais de Marco, Tony e Música)
apresentaram-se vestindo ternos de cor oposta ao de sua pele, branco para Tony
e preto para Marco, talvez dando mostras de um Portugal mais integrado etnicamente.
Decepcionada com os maus resultados,
a RTP decidiu por conta própria não participar do Eurovisão de 2002, nem mesmo
foi realizado um certame nacional.
Já em 2003 o Festival RTP da Canção
foi realizado em conjunto com o reality
show musical Operação Triunfo. Rita
Guerra foi indicada para interpretar as três canções concorrentes, entre
as quais saiu vencedora “Deixa-me Sonhar (Só Mai Uma Vez)” (Paulo Tomé Martins
da Encarnação), com 75% dos votos, apurados através do televoto (ligações
telefônicas e SMS). Com uma versão da canção tendo os últimos versos cantados em
inglês, Rita Guerra obteve apenas o 22º lugar em Riga, na Letônia.
Em 2004, ano em que a UER implantou
um sistema de semifinal e final no Eurovisão, o Festival RTP da Canção foi
novamente realizado em conjunto com o programa de caça-talentos Operação Triunfo. “A RTP entregou uma
canção a cada um dos 3 vencedores da Operação Triunfo 2 e colocou nas mãos dos
portugueses a decisão.” (Festivais da
Canção [online][8]). Saiu
campeã a canção “Foi Magia” (Paulo Neves), conferindo o direito de Sofia
Vitória representar Portugal no Eurovisão de Istambul, na Turquia, onde acabou
ficando pela semifinal, em 15º lugar entre os 22 concorrentes.
Visando o corte de gastos, a RTP
realizou em 2005 a “II Selecção Interna para o Eurofestival”, de modo que foi
apresentada uma única canção, bilíngue, cantada em português e em inglês,
intitulada “Amar” (Alexandre Honrado/ Ernesto Leite/ José da Ponte),
interpretada pelo duo 2B. Em Kiev, na Ucrânia, o duo foi eliminado na semifinal,
ficando com o 17º lugar entre os 25 países concorrentes.
Na edição de 2006 saiu campeã a
canção “Coisas de Nada” (José Manuel Afonso/ Elvis Veiguinha), interpretada
pelo grupo Nonstop. No Eurovisão de Atenas, Grécia, o girls group não fez uma boa apresentação, ficando pela semifinal,
em 19º lugar entre os 23 concorrentes.
Já em 2007, venceu a canção “Dança
Comigo (Vem ser Feliz)” (Emanuel/ Tó Maria Vinhas), interpretada por Sabrina. A
canção foi eliminada já na semifinal do Eurovisão, em 11º lugar.
No ano de 2008, cria-se novamente
grande expectativa em torno da canção vencedora, “Senhora do Mar (Negras Águas)”
(Carlos Coelho/ Adrej Babič), interpretada por Vânia Fernandes. E a canção
correspondeu às
expectativas, levando Portugal à final daquele Eurovisão de Belgrado, na
Sérvia. Na final, entretanto, Vânia alcançou apenas o 13º lugar, entre os 25
países concorrentes.
No ano seguinte, entre as 12
concorrentes, a canção vencedora foi “Todas as Ruas do Amor” (Pedro Marques/
Paulo Pereira), interpretada pelo grupo Flor-de-Lis. Os Flor-de-Lis passaram da
semifinal do Eurovisão de Moscou, Rússia, em oitavo lugar. Na final, no
entanto, apesar de o grupo se mostrar muito bem integrado, a canção ficou
apenas com o 15º lugar.
Em 2010, o festival iniciou com uma
pré-seleção das canções pela internet que contou com 30 canções, escolhidas entre
os 420 originais recebidos. Seguiu-se a essa fase duas semifinais, onde terminou
vencendo a canção “Há Dias Assim” (Augusto Madureira), interpretada por Filipa
Azevedo que levou Portugal novamente à final do Eurovisão, onde, no entanto,
ficou com o 18º lugar.
Com o agravamento da crise econômica
em Portugal, a RTP decidiu realizar em 2011 o festival em um formato mais simples,
de modo que foi feita uma pré-seleção pela internet, em que os cibernautas puderam votar em 24 canções,
entre as quais classificavam-se 12 canções para a final. Venceu a canção “A
Luta é Alegria” (Nuno Duarte/ Vasco Duarte), interpretada pelo grupo Homens da
Luta, grupo musical que parodia os “cantos de intervenção” do período
revolucionário. No
Eurovisão os Homens da Luta não agradaram e receberam muitas vaias, o que já
havia ocorrido no próprio Festival da RTP, quando foram anunciados vencedores.
Comentou-se que os Homens da Luta representavam bem a insatisfação da população
ante a crise econômica que se abatia sobre Portugal, mas parece que o tom
cômico da apresentação pesou para que ocorressem as vaias, despertando a
insatisfação dos portugueses e do público eurovisivo. O grupo ficou pela semifinal
do Eurovisão.
Já em 2012, o tema do festival foi o
fado, que havia se tornado Patrimônio da Humanidade em 2011, de modo que todas
as canções fizeram menção ao gênero. A vencedora, “Vida Minha”
(Carlos Coelho/ Andrej Babič), interpretada por Filipa Sousa, tinha mesmo ares
de fado, incorporando guitarra portuguesa e acordeão, mas com arranjos modernos
incluindo samplers e loops rítmicos. No Eurovisão de Baku,
Azerbaijão, acabou ficando com o 13º lugar na semifinal que participou, não
conseguindo, portanto, passar para a final.
No ano de 2013, por motivos
econômicos, Portugal não participou do Eurovisão.
Em 2014, comemorou-se os cinquenta anos do Festival RTP
da Canção. A canção
vencedora foi “Quero Ser Tua (Como a Lua é do Luar)” (Emanuel), interpretada
por Suzy, ganhando o direito de representar Portugal no Eurovisão de
Copenhagen, na Dinamarca, exatamente onde Portugal teve sua primeira
participação cinquenta anos antes. Mas a canção ficou apenas com o 12º lugar entre os 16
concorrentes da semifinal que participou.
Em 2015 a canção
vencedora do festival português foi "Há um Mar que Nos Separa" (Miguel Gameiro),
interpretada por Leonor Andrade, um pop-rock
com certos ares de fado, mas que
foi aparentemente pouco competitivo no contexto eurovisivo.
Em 2016 a RTP
optou por não participar do Eurovisão, mas no ano seguinte a situação se
inverteria drasticamente, quando a vencedora do festival português, "Amor pelos Dois" (Luísa Sobral),
interpretada pelo irmão da autora, Salvador Sobral, venceria também o
Eurovisão, de Kiev, Ucrânia, sendo a primeira vitória entre todas as
participações portuguesas no eurofestival, dando também o direito de Portugal
sediar pela primeira vez o festival europeu, a ser realizado em maio de 2018. "Amor pelos Dois", que lembra mais uma
valsinha, bem diferente das catárticas canções eurovisivas, logo ganhou
inúmeras versões, sendo incluída até mesmo na trilha de abertura da novela
brasileira Tempo de Amar.
[1] O Festival
Eurovisão da Canção (Eurovision Song
Contest – ESC), criado em 1956 pela União Europeia de Radiodifusão (UER), foi
idealizado por Marcel Bezençon e inspirado no Festival de San Remo (Festival della Canzone Italiana),
iniciado em 1950, na Itália. Eurovision
foi o primeiro nome da UER, cunhado pelo tablóide inglês The Evening Standard, em 1951. Igual iniciativa ocorreu na
Ásia-Pacífico com a criação do Festival ABU da Canção (ABU TV Song Festival), em 2012.
[2] Disponível em:
<http://213.58.135.110/50anos/50Anos/Livro/DecadaDe60/Do2ProgramaALuaEAo/Pag16>
Acesso em: 19 jan. 2014.
[3] Neste ponto é
interessante notarmos que o cravo vermelho não era visto como símbolo nacional
até 1974, quando eclodiu a Revolução dos Cravos, a estes casos Eric Hobsbawn e
Terence Ranger denominam “tradição inventada”, pertencendo, portanto, a um
passado recente. Ver: HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence (orgs.). A invenção das tradições. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1977, pp. 09-23. Nesse mesmo sentido, Stuart Hall nos
mostra que: “No mundo moderno, as culturas nacionais em que nascemos se
constituem em uma das principais fontes de identidade cultural. [...] Essas
identidades não estão literalmente impressas em nossos genes. Entretanto, nós
efetivamente pensamos nelas como se fossem parte de nossa natureza essencial.”
(HALL, 2006, p. 47).
[4] Ver: ALMEIDA, L. P.; ALMEIDA, J. P.. Enciclop. da Música Ligeira Portuguesa.
Lisboa: C. de Leitores, 1998, p. 148.
[5] Sobre o “canto de intervenção” ver: RAPOSO, E. M.. Canto de intervenção: 1964-1974. 3ª ed..
Lisboa: Público, 2007.
[6] A outra senha do 25 de Abril foi “Grândola,
Vila Morena” (José Afonso), canção inspirada no cante alentejano. Ver: AFONSO,
José. Cantigas do Maio. Orfeu, 1971.
[7] Disponível em:
<http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/EFEMERIDES/FESTIVAL/FestivaldaCancao_1996.htm>
Acesso em. 09 fev. 2014.
[8] Disponível em:
<http://festival04.no.sapo.pt/> Acesso em: 27 set. 2013.
Este texto é parte [adaptada] do artigo "Festival RTP da Canção: Os cinquenta anos do festival eurovisivo português", publicado na Revista Brasileira de Estudos da Canção, nº6, jul.-dez. 2014. Disponível em: http://rbec.ect.ufrn.br/data/_uploaded/artigo/N6/RBEC_N6_A6.pdf
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